quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Arena Versus Estádio

Uma crônica para espairecer. - Dois mil reais, o amendoim? Que absurdo! - Amigo, esse é amendoim de arena e não de estádio. Retruquei ao consumidor indignado com o preço do pacote do amendoim cobrado por um pobre, menor vendedor, que, contrariando “normas da Fifa”, se aventurava a vender sua mercadoria às cercanias da “Arena Itaipava”. Não sabendo ele – o consumidor, ou sabia? – dos preços cobrados no interior da arena. Alguém, próximo a mim, após um dos jogos da Copa das Confederações, comentou com assombro - Não vi negros no estádio! A propósito, Afonsinho, poucos sabem de quem se trata, ex-jogador dos idos 70, diferenciado, aliás bem diferenciado dos estereótipos do jogador de futebol. Ele, naqueles tempos, naqueles anos difíceis, quando muitos se escondiam no silêncio, misto de jogador e acadêmico de medicina, já emitia suas opiniões e foi o primeiro jogador, ao que me parece, na História do futebol brasileiro, a obter passe-livre, numa conjuntura em que a relação empregador(clube)/empregado(jogador) era completamente desfavorável à última das partes, por causa do “passe-preso”. Bem, em recente crônica, ele aconselha a Neguinho da Beija-Flor a alterar o refrão do seu samba que diz: “Domingo eu vou ao Maracanã” para “Domingo eu não vou ao Maracanã”, em razão, acredito eu, da cor/origem pobre. Justificando: “no cenário de elitização do futebol, penso em sugerir ao Neguinho que mude a letra do seu samba”. Pois bem, começo com este arrodeio, para dizer que, por uma deferência toda especial de Rodrigo, uma das minhas três joias, compareci à arena em foco para assistir aos três jogos da Copa das Confederações para ali programados. E me senti como se fora um alienado completo, ao viver toda aquela atmosfera em que me vi envolvido, atropelado. Ah! bons tempos em que eu resolvia entrar por onde bem quisesse; a escolher uma dentre as dezenas de catracas que a velha Fonte Nova nos oferecia e sentava onde bem entendesse; de trocar de lugar conforme as conveniências, tantas vezes quanto achasse necessário e muitas amizades e conhecimento entre pessoas foram feitos pelo convívio no estádio. Naquele planeta, o planeta da Fifa, não! O lugar é prévia e obrigatoriamente determinado e comportadamente devo manter-me por todo o tempo. De posse do ticket, - ai, que chique! – sou conduzido, como um bovino, em direção ao curral, por vaqueiros, digo, voluntários(!!!), em geral, jovens, devidamente uniformizados, com megafones ou não e em estruturas montadas acima da superfície ou mesmo na própria superfície, para uma espécie de labirinto. Sim, LABIRINTO, de onde num vai e vem incessante e como se andando sem chegar a lugar algum, para avançar pouquinho a cada volta – esforço que buliu com o meu labirinto, sem trocadilho, hein? – consigo eliminar a etapa labiríntica e, hã, pensa que cheguei? Ledo engano, inicia-se nova etapa com voluntários indicando os portões, são muitos os portões; os níveis, (a arena tem três níveis de arquibancadas); os blocos, são inúmeros; as fileiras e – ufa! – finalmente posso encontrar o meu assento, este, pessoal e intransferível. Bem, o jogo em si, não é tão diferente dos jogos que se assitem dos estádios, mas não há mais lugar para apostadores, torcedores em grupos organizados para os mais absurdos hábitos do tradicional frequentador de estádio de futebol. Não há mais lugar para pretos, para pobres, para vendedores ambulantes, baiana do acarajé. Do churrasquinho de gato; do isopor. Que saudade dos antigos bares, onde bebíamos e podíamos papar deliciosos pratos populares, gostosamente elaborados. Os estádios, com aquela áurea própria e espontaneamente feita pela gente do povo, gente que fez a extrema popularidade e o imenso poder deste esporte, estão sendo inexoravelmente substituídos. O futebol que foi um esporte eminentemente da escol em seus primórdios; no padrão Fifa, parece estar sendo submetido a um processo de retorno, às origens, extinguindo os populares estádios, segregando os populares espectadores. Nada restará de material (atenção para o real sentido do vocábulo) da Fonte Nova, do Mineirão, do Maracanã... a não ser o patrimônio imaterial tombado na lembrança da geração que os conheceram e deles usufruíram. Ainda bem que poderei contar ainda por algum tempo o meu Barradão!