Começo com um título erradamente
designado. Passar um dia inteiro numa
clínica, quem aguenta?
O cenário próprio de uma clínica já
é deveras constrangedor, especialmente para aqueles que vão e estão à espera de,
ainda que imaginariamente, um diagnóstico cruel. No plano do entretenimento, da
“cultura” e das “artes”, quantidades bondosas (?!!!) de exemplares de uma
nauseabunda (argh!) revista semanal e uma ou várias telas de TV em que se apresentam
um tão falador “louro” quanto submisso a uma “loura pirua”, apresentadora,
compõem a paisagem. O demais, faz-se das pessoas; das atendentes e seus
indefectíveis chamados: “Senhor ou senhora fulano ou fulana de tal”, mesmo que
se trata de um criança e das outras pessoas, aliás pacientes. Seu entra e sai;
suas idiossincrasias; suas atitudes muitas das vezes, de impaciência, de
contestação. Como, por exemplo, a “paciente” que chegara atrasada e já estava há
mais de duas horas sem que fosse atendida:
“...somente quinze, nem quinze
minutos, atrasada! que absurdo! Que falta de consideração! Poderiam me chamar
num desses intervalos e vejam que ainda eu iria para o Centro Administrativo
trabalhar!”
(Já se vê
que se trata de uma zelosa funcionária pública, mas não uma barbané –
consultar, por favor, o Aurélio – qualquer).
Em outras
oportunidades, conversas sobre amenidades, mas também sobre coisas sérias, sim!
Numa conversa, entre um senhor e uma senhora, integrantes da faixa etária dos “enta”,
primo e prima que não se encontravam havia algum tempo, passaram a falar do
país.
“Ah! ninguém aguenta viver aqui,
não! Olha pergunto sempre a minha filha: quando é que você vai voltar?”
“Mamãe, cada vez que leio as
notícias daí, mais eu tenho vontade de ficar aqui. Sabe? Um furto numa farmácia
aqui é notícia em jornal, imagine!”.
O primo não
deixou por menos ao falar sobre filhos seus que se encontram no esplêndido primeiro
mundo, no eldorado das “zelites” brasileiras. A propósito, um dos filhos de
Roberto Marinho está de mudança para Miame. Sorry,
periferia.
Toda a
conversação foi captada sem que se necessitasse de uma maior atenção, em
decorrência dos sons em altos decibéis emitidos do parlatório.
Sobre esse
complexo de vira-latas, (êpa já estou saindo da clínica), vejam o que diz o britânico Adam Smith, blogueiro da série "Para
Inglês Ver", da BBC Brasii:
“os brasileiros exageram na rejeição
ao seu próprio país e também se diminuem em relação a países desenvolvidos,
notadamente os Estados Unidos...
processo [refere-se ele ao “complexo
de vira-latas”, para complexo de inferioridade do brasileiro, alcunhado por
Nelson Rodrigues – nota de Mário César] que parece estrangular a identidade brasileira... Pode
ser sentido na comida. Neste "país tropical" tão fértil e com tantos
produtos maravilhosos, é mais fácil achar hot dog e hambúrguer do que tapioca
nas ruas. Pode ser ouvido na música americana que toca nos carros, lojas e
bares no berço do Samba e da Bossa Nova...
O Brasil está
passando por um período difícil e, para muitos brasileiros com quem falei sobre
os problemas, a solução ideal seria ir embora, abandonar este país para viver
um idealizado sonho americano. Acho esta solução deprimente. Não tenho remédio
para os problemas do Brasil, obviamente, mas não consigo me desfazer da
impressão de que, talvez, se os brasileiros tivessem um pouco mais orgulho da
própria identidade, este país ficaria ainda mais incrível. Se há insatisfação,
não faz mais sentido tentar melhorar o sistema?”
Pois bem,
somente acessando blogues, revistas,
jornais alternativos é que podemos ter outra compreensão do país. Enquanto ficar
a se informar somente pelos representantes da grande imprensa obter-se-á tão
somente o quadro que ela, a grande imprensa, o verdadeiro partido de oposição,
pinta para o “quanto pior melhor”.
P.S.: as
palavras do blogueiro britânico foram
extraídas do Blog de Luis Nassif.